Tome qualquer lista das principais companhias chinesas e, por mais que elas se distribuam por setores diferentes e tenham estratégias distintas, será fácil encontrar um fator comum a seu sucesso internacional. Essas empresas têm se destacado graças a um diferencial competitivo devastador: a capacidade de vender por preços “chineses”, ou seja, incompreensivelmente reduzidos. Não raro, um terço ou um quarto do preço universal de um produto. Há 20 anos, o fenômeno estava restrito a quinquilharias de baixa qualidade. Na última década, passou a incluir de computadores a pianos; de bens de capital a motocicletas. Agora, vale também para automóveis.
“Existe um mistério por trás do preço chinês”, afirma o economista Antônio Barros de Castro, assessor da presidência do BNDES e estudioso das empresas chinesas. “O mundo todo se pergunta: como é possível vender tão barato?”
A resposta está, de início, numa abordagem diferente do uso da mão-de-obra barata. Empresas ocidentais que levaram suas linhas de produção para a China, dispostas a replicar o milagre do baixo preço, só conseguiram resultados parciais. Por quê? Porque, na maioria dos casos, utilizam a força de trabalho de baixo custo apenas no chamado chão de fábrica. Enquanto a típica multinacional chinesa se vale dela em todas as etapas, inclusive na engenharia.
“Existe um mistério por trás do preço chinês”, afirma o economista Antônio Barros de Castro, assessor da presidência do BNDES e estudioso das empresas chinesas. “O mundo todo se pergunta: como é possível vender tão barato?”
A resposta está, de início, numa abordagem diferente do uso da mão-de-obra barata. Empresas ocidentais que levaram suas linhas de produção para a China, dispostas a replicar o milagre do baixo preço, só conseguiram resultados parciais. Por quê? Porque, na maioria dos casos, utilizam a força de trabalho de baixo custo apenas no chamado chão de fábrica. Enquanto a típica multinacional chinesa se vale dela em todas as etapas, inclusive na engenharia.
Outro diferencial é tecnológico, mas não sentido trivial. “A empresa chinesa usa a última tecnologia disponível em seu setor, mas também a penúltima, a anti-penúltima e até a primitiva, o que exige muita engenharia”, diz Barros de Castro. “Nenhuma empresa ocidental combina tecnologias assim. O que explica porque os chineses conseguem dar sucessivos tombos nos custos e aumentar a diversidade dos produtos oferecidos.”
Como, na maioria dos casos, são parcialmente estatais, muitas das multinacionais chinesas usam o acervo dos institutos públicos de tecnologia com a maior liberdade. O caso clássico é o da antiga Legend, fabricante de computadores que nasceu dentro da Academia Chinesa de Ciência, e deu origem à Lenovo. “Os cientistas transitavam de um lado para o outro com a maior desinibição”, diz Barros de Castro. Segundo ele, este movimento hoje é menos freqüente, mas ainda ocorre. “Muitas inovações de institutos estatais chineses - às vezes ligados ao complexo militar, quase sempre engajados em trocas de experiência e tecnologia com centros de pesquisa do Ocidente - são repassados às empresas por valores que nada têm a ver com os custos de mercado.”
Outra vantagem que as empresas chinesas têm é a conexão íntima que existe entre elas. A lógica econômica dos distritos industriais ou “clusterização”, na China, foi levada ao limite. Os clusters se espalham ao longo do Delta do Rio das Pérolas, região que engloba Hong Kong, Macau e parte da província de Guangdong. Para ficar em três exemplos, há em Leilu o cluster de bicicletas; em Huizhou, o cluster de DVDs; e, mais importante, em Dongguan o cluster de computadores. Toda a cadeia de fornecedores dessas indústrias está reunida nesses pólos. São clusters com mais de mil empresas cada um. E há forte intercâmbio entre elas. É um sistema radicalmente diferente do just in time, com componentes chegando de todas as partes do mundo. Nos distritos chineses, cada empresa faz um pedacinho do produto final, mas todos trabalham lado a lado, pensando no produto final. Este fator, isoladamente, já garante bicicletas, computadores e DVDs de 10% a 20% mais baratos.
Hoje está claro que o grande diferencial chinês provém não da criação de tecnologias, mas da capacidade de barateá-las drasticamente. Quando um fabricante chinês consegue reduzir o preço de um aparelho de DVD de 300 para 30 dólares, ele passa a ser capaz de vendê-lo não só na China, mas também na África, na América Latina e no restante da Ásia. “O DVD se tornou um símbolo. É algo análogo ao que Henri Ford fez quando, em 1906, lançou um automóvel simples e barato o bastante para estar ao alcance do trabalhador americano”, diz Barros de Castro. “A China multiplicou a idéia do Modelo T e o expandiu nas mais diversas direções.”
Vender na China para poder vender no mundo. Este talvez seja o segredo. Uma multinacional chinesa parte da conquista de uma base sólida local para ganhar a Classe C do planeta. “Quando descobrem uma solução tecnológica que os põem em vantagem, eles (os empresários chineses) têm duas estratégias pela frente”, afirma o economista. “Podem manter o mercado limitado e ter grandes margens de lucro, mas nunca fazem isso. Preferem jogar o preço lá embaixo e ganhar em volume.” Assim são catapultados para o mercado internacional.
“Isso coloca mil problemas para o Ocidente e para o Brasil em particular”, diz Barros de Castro. “É ingênuo responder a este desafio dizendo que a saída é aumentar a sofisticação dos produtos. A China também usa as tecnologias mais avançadas e hoje oferece design de primeira.” Do mesmo modo, a idéia de buscar nichos é questionável. Uma das características da internacionalização chinesa foi transformar nichos em mercados de massa, vendendo produtos supostamente para públicos segmentados por uma fração do preço universal.
O exemplo mais conhecido é a história de como a Haier tornou-se líder mundial na fabricação de adegas climatizadas. “Agregando sua capacidade de produção de baixo custo com tecnologias de produção de adegas climatizadas desenvolvidas no mundo, a empresa, em parceria com o Wal-Mart (Sam’s Club), desenvolveu produtos 50% mais baratos do que os concorrentes, porém com tecnologias muito mais avançadas”, afirma o relatório “200 Dragões Chineses”, da Fundação Dom Cabral. “Em poucos meses, a empresa conquistou 60% do mercado americano e em seguida do mercado mundial. A partir desta alavancagem, a Haier passou a desenvolver outros produtos, buscando ocupar nichos de mercado em que pudesse associar baixo preço e tecnologia, tornando-se assim líder de mercado em segmentos de televisão, ar condicionado, lavadoras, etc.”
A lógica, como se vê, deve ser pragmática: se você não pode com os chineses, faça como eles. Na medida em que o modelo chinês de produção tem êxito, ele se propaga para o mundo. “A China está criando soluções que vão se tornar universais”, diz Barros de Castro. “Está fazendo hoje o que os Estados Unidos fizeram na virada do século 19 para o século 20.”
Como, na maioria dos casos, são parcialmente estatais, muitas das multinacionais chinesas usam o acervo dos institutos públicos de tecnologia com a maior liberdade. O caso clássico é o da antiga Legend, fabricante de computadores que nasceu dentro da Academia Chinesa de Ciência, e deu origem à Lenovo. “Os cientistas transitavam de um lado para o outro com a maior desinibição”, diz Barros de Castro. Segundo ele, este movimento hoje é menos freqüente, mas ainda ocorre. “Muitas inovações de institutos estatais chineses - às vezes ligados ao complexo militar, quase sempre engajados em trocas de experiência e tecnologia com centros de pesquisa do Ocidente - são repassados às empresas por valores que nada têm a ver com os custos de mercado.”
Outra vantagem que as empresas chinesas têm é a conexão íntima que existe entre elas. A lógica econômica dos distritos industriais ou “clusterização”, na China, foi levada ao limite. Os clusters se espalham ao longo do Delta do Rio das Pérolas, região que engloba Hong Kong, Macau e parte da província de Guangdong. Para ficar em três exemplos, há em Leilu o cluster de bicicletas; em Huizhou, o cluster de DVDs; e, mais importante, em Dongguan o cluster de computadores. Toda a cadeia de fornecedores dessas indústrias está reunida nesses pólos. São clusters com mais de mil empresas cada um. E há forte intercâmbio entre elas. É um sistema radicalmente diferente do just in time, com componentes chegando de todas as partes do mundo. Nos distritos chineses, cada empresa faz um pedacinho do produto final, mas todos trabalham lado a lado, pensando no produto final. Este fator, isoladamente, já garante bicicletas, computadores e DVDs de 10% a 20% mais baratos.
Hoje está claro que o grande diferencial chinês provém não da criação de tecnologias, mas da capacidade de barateá-las drasticamente. Quando um fabricante chinês consegue reduzir o preço de um aparelho de DVD de 300 para 30 dólares, ele passa a ser capaz de vendê-lo não só na China, mas também na África, na América Latina e no restante da Ásia. “O DVD se tornou um símbolo. É algo análogo ao que Henri Ford fez quando, em 1906, lançou um automóvel simples e barato o bastante para estar ao alcance do trabalhador americano”, diz Barros de Castro. “A China multiplicou a idéia do Modelo T e o expandiu nas mais diversas direções.”
Vender na China para poder vender no mundo. Este talvez seja o segredo. Uma multinacional chinesa parte da conquista de uma base sólida local para ganhar a Classe C do planeta. “Quando descobrem uma solução tecnológica que os põem em vantagem, eles (os empresários chineses) têm duas estratégias pela frente”, afirma o economista. “Podem manter o mercado limitado e ter grandes margens de lucro, mas nunca fazem isso. Preferem jogar o preço lá embaixo e ganhar em volume.” Assim são catapultados para o mercado internacional.
“Isso coloca mil problemas para o Ocidente e para o Brasil em particular”, diz Barros de Castro. “É ingênuo responder a este desafio dizendo que a saída é aumentar a sofisticação dos produtos. A China também usa as tecnologias mais avançadas e hoje oferece design de primeira.” Do mesmo modo, a idéia de buscar nichos é questionável. Uma das características da internacionalização chinesa foi transformar nichos em mercados de massa, vendendo produtos supostamente para públicos segmentados por uma fração do preço universal.
O exemplo mais conhecido é a história de como a Haier tornou-se líder mundial na fabricação de adegas climatizadas. “Agregando sua capacidade de produção de baixo custo com tecnologias de produção de adegas climatizadas desenvolvidas no mundo, a empresa, em parceria com o Wal-Mart (Sam’s Club), desenvolveu produtos 50% mais baratos do que os concorrentes, porém com tecnologias muito mais avançadas”, afirma o relatório “200 Dragões Chineses”, da Fundação Dom Cabral. “Em poucos meses, a empresa conquistou 60% do mercado americano e em seguida do mercado mundial. A partir desta alavancagem, a Haier passou a desenvolver outros produtos, buscando ocupar nichos de mercado em que pudesse associar baixo preço e tecnologia, tornando-se assim líder de mercado em segmentos de televisão, ar condicionado, lavadoras, etc.”
A lógica, como se vê, deve ser pragmática: se você não pode com os chineses, faça como eles. Na medida em que o modelo chinês de produção tem êxito, ele se propaga para o mundo. “A China está criando soluções que vão se tornar universais”, diz Barros de Castro. “Está fazendo hoje o que os Estados Unidos fizeram na virada do século 19 para o século 20.”
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